Entre fascinação e antipatia, Freud está vivo; assista às aulas

Em meio a admiração e resistência, legado de Freud permanece atual e inspira formação psicanalítica gratuita.

Vinícius Sgarbe
5 min read

Freud explica? Nem Freud explica? O fato é que o psicanalista de Viena não está mais vivo para dar ele mesmo as explicações que gostaríamos. Esses dias, lendo um dos livros dele, encontrei uma nota de rodapé espirituosa, mais ou menos assim: “casais podem se ligar pelo amor e pela violência. Temos que estar preparados para isso, porque nem todos seremos como aquela camponesa que reclama que o marido não a ama mais porque há duas semanas não a espanca”. A literatura freudiana está distante de ser enfadonha.

O autor é amplamente famoso, desde as comunidades psicanalíticas, passando pela academia científica, ou em projetos de leitura individuais. Para uns, um gênio sincero e generoso, para outros, um “maluco”. Para quem teve qualquer aproximação decente com a psicanálise, sabe-se, sobre o assunto anterior, que tanto faz. Para toda grande luz existe sua igualmente grande escuridão correspondente. E, combinemos, não se deve jogar o bebê com a água do banho. “E tá tudo bem”, diria sorrindo a psicanalista Áurea Moneo (na imagem a seguir). Ela é professora de psicanalistas em formação, e supervisora de quem atua como analista.

Áurea Moneo. Imagem: Reprodução.

Entrevista com Áurea

Vinícius Sgarbe: Querida Áurea, penso que há um poder descomunal na psicanálise, bem como em qualquer outra coisa em que se acredite com firmeza. Às vezes, encontro na internet frases atribuídas a Freud que certamente ele jamais disse ou escreveu. Mas pouco ou nada me afeta, porque não sou tomado por ciúmes. Penso que nesta altura do campeonato toda ajuda é bem-vinda. Além do mais, Freud não me paga para eu ser fiscal da marca dele — risos. Conte-me, minha amiga, que pé que está sua psicanálise?

Área Moneo: Querido Vinicius, acredito que tanto tempo depois e continuar a ser tão lembrado, sendo a ele atribuídas diversas falas, a maioria delas típicas da nossa contemporaneidade, é claro sinal de seu brilhantismo. Talvez um dos poucos ícones que mereça tanta reverência, tanto dos que o odeiam, por não se permitirem admirar, como daqueles que o admiram de fato. Segue, mais vivo do que nunca, em nossa memória. E, em tempos de construção de narrativas, segue alimentando desejos do inconsciente, validando falas de autores anônimos.

Formação do psicanalista

Para se tornar um psicanalista não é preciso muito mais que uma curiosidade irremediável por pessoas. Isto é, o que move uma formação é a investigação da própria vida, onde tudo começa, e depois dos cenários em volta de nós, que frequentemente, senão sempre, estão cheios de “outros”.

Em linhas gerais, Freud é um ponto de partida, uma cartografia para se explorar a sabedoria e a ciência. Se Freud é a última palavra? Óbvio que não. Se outros autores são bem-vindos? Depende do autor — risos —, mas são apreciados, claro.

Aula magna

Nesta quinta-feira (11), e na quinta da próxima semana (18), às 19h30, o Illumen, um centro de formação em psicanálise clínica, promove aulas magnas da formação psicanalítica. A primeira tem o título "Autoconhecimento: visões da psicanálise", apresentada pela professora Anamaria Racy. No dia 18, Áurea Moneo fala sobre “As emoções e o adoecer”. Os participantes devem se inscrever no link abaixo. Vai ser on-line e de graça. Para saber mais sobre o Illumen, acesse o site.

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Leia insights sobre a interação de humanos com modelos de linguagem de IA, e sobre os ODS no Brasil. Lab Educação 2050 Ltda, que mantém este site, é signatária do Pacto Global das Nações Unidas.

Psicanálise e tecnologia humana

O debate on-line amplia trocas e incentiva a autorreflexão, impulsionando o desenvolvimento.

ODS 3: saúde mental coletiva

A psicanálise previne adoecimentos emocionais e fortalece a convivência social.

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Quando, às três da tarde da sexta-feira, Jesus suspira e entrega seu espírito a Deus, passamos a nos perguntar “o que fizemos?”. Para um distraído, deve ser nada além de uma culpa a mais para a coleção. Nós, freudianos, porém, compreendemos tal pergunta como a origem da civilização.

É uma questão de geolocalização, se é que me entende.

Onde estamos, exatamente, depois de termos assassinado o Criador? Se estivermos entre os que fazem a si mesmos aquela pergunta, tal qual no mito do parricídio, muito que bem. Algo assim tem potencial de nos deschucralizar. Mas se estivermos para além da fronteira da responsabilidade, estamos perdidos.

É neste último lugar que o indivíduo vibra com um Jesus que “senta o chicote” nos ladrões — sem se dar conta de que ele mesmo é o ladrão mencionado nas Escrituras. Vibra com o ultraje aos líderes fariseus, sem se dar conta de que o Mestre o ultraja no instante da leitura.

Escrevi sobre esse fenômeno, em um capítulo denominado “narcisismo das pequenas diferenças” (é um conceito psicanalítico). Em resumo, o ódio é ainda mais talentoso que o amor quando o assunto é unir seres humanos, formar exércitos, igrejas, e torcidas organizadas.

Quem abre uma bíblia impressa nos anos setenta, oitenta — traduzida por João Ferreira de Almeida, miolo rosa, cortado por um índice tátil — encontra a Palestina na seção de mapas.

Quer dizer. Até “ontem”, ninguém tinha qualquer dúvida quanto ao Jesus que matamos ser palestino. O que nos fez mudar de lado, além do dinheiro?

A filosofia de René Girard coincide com a prática cristã, quando da formação de uma religião a partir da violência, tanto quanto essa mesma violência gera a humanidade civilizada para os freudianos. Mas esse autor provoca particularmente quando o morto é Jesus. Desde que matamos um inocente, a roda da violência gira no vazio.

Se a Páscoa renova nos cristãos a esperança da ressurreição, que pudesse também renovar em todos nós alguma garantia de que, pelo menos uma vez por ano, perguntamos “o que fizemos?”.

Imagem da paixão

A fotografia deste artigo, registrada por Mohammed Salem da agência Reuters e divulgada pela World Press Photo, foi a vencedora do prêmio World Press Photo do Ano. A imagem retrata Inas Abu Maamar, palestina de 36 anos, em um momento de dor profunda ao abraçar o corpo de sua sobrinha Saly, de apenas 5 anos, que perdeu a vida em um bombardeio israelense. A cena ocorreu no hospital Nasser, localizado em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, em 17 de outubro de 2023.

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Ainda que tenha visto o filme Pantaleão e as visitadoras (divertido e indicado!), pouco conheço dos romances de Mario Vargas Llosa, Nobel da literatura — escritor peruano que despediu-se neste dia 13.

Gostava dele! Me recomendaram fortemente uma vez A casa verde — curiosamente um professor americano. Porém, este livro da foto, repleto de ensaios, reflexões e provocações, que ganhei em 2013, li e me foi bem marcante.

Um papo-cabeça aqui: como geralmente em cursos de comunicação a gente estuda Escola de Frankfurt, aprende-se que a culpa, por assim dizer, do esvaziamento poético visto nas artes ao longo da história, da decadência estética do que se entende por belo, bem como o fim da chamada "alta cultura", seria resultado da produção em série, da busca pelo lucro em escala, da indústria cultural: em suma uma consequência do capitalismo.

Pra minha supresa, este livro me revelou um ponto de vista diferente: a questão é política, que envolve a herança de um revanchismo contra o gosto da aristocracia (ou das altas classes) desde as revoluções.

TRata-se de um repúdio crescente à sociedade tradicional, após as grandes guerras mundiais, e, na sua essência, sobretudo: de fundo religioso — afinal, na origem de todas as civilizações, em todos os tempos, justamente dos ritos religiosos advieram e se desenvolveram as manifestações artísticas.

Parte-se da busca pelo sublime, das experiências místicas, que posteriormente formaram as bases do que entendemos por culturas. Um elo que virou apenas um eco na vida ocidental contemporânea, isto quando não totalmente banido, execrado, num mundo que, ao seu ver, culturalmente, caminha rumo ao nada.

Ou, como já observamos agora, para o conteúdo gerado por inteligência artificial.