Pesquisa da UFSC revela que experiência prolongada influencia gestores a optarem por medidas conservadoras.
Sucesso no humor britânico, Philomena Cunk expõe com ironia a fragilidade intelectual presente até no jornalismo sério.
Há alguns anos, Dra. Cida Stier me levou com ela a um treinamento de comunicação para policiais rodoviários federais. Ao fim de uma das fases teóricas, ela propôs um roleplay (uma espécie de “teatro” que simula situações). O “elenco” era um policial com um repórter, em sendo eu o repórter. E o caso era: “um motorista de caminhão morreu em um tombamento, há interrupção de trânsito”. Em frente a uma turma numerosa, seguimos assim:
—Bom dia, tudo bem o senhor? Meu nome é Vinícius, sou repórter. Qual é seu nome?
Papo vai, papo vem, ele chega ao ponto de me contar:
—Uma carreta tombou. Mas temos poucas informações, porque estamos a caminho. — Eu pergunto: —O motorista está bem? — Ao que ele responde: —Ele não está morto? — Nem mesmo o policial conseguiu concluir a frase sem uma gargalhada honesta. A partir disso, todos rimos, porque, digamos, os atores se bateram um pouco com o texto.
Lembro desse episódio quando assisto à personagem inglesa Philomena Cunk (Diane Morgan), produdiza pela BBC. Philomena é uma documentarista ignorante, porém equipada. Como é apresentadora de televisão, tem os diálogos com os entrevistados gravados em vídeo. A postura dela é absolutamente exemplar: voz, roupa, gestos. Mas apesar disso, é burra como uma porta. Os episódios são memoráveis.
Em um deles, ela confunde “Camelot” de Rei Artur com “cum a lot”. Em outro, ela grava em volta de Davi de Michelangelo e se pergunta se, pela ausência na escultura, as pessoas daquela época tinha ânus. Neste a seguir, ela fala sobre as previsões de George Orwell no livro “1984”. Ela reforça que tais previsões foram feitas no livro usando “nada além de palavras” – risos.
Ao que pese a BBC ser uma das mais proeminentes marcar de jornalismo do mundo, junto à ABC dos Estados Unidos, à TV Globo do Brasil, à Deutsche Welle da Alemanha, ao Franceinfo da França, a existência de Philomena a mim não parece mero formato cômico. É, sobretudo, um convite à aprendizagem de rir de nós mesmos.
Há alguns anos, em visita a uma agência de Goiânia, o publicitário Renato Monteiro me contou que a primeira coisa que faziam diante da chegada de um novo projeto de anúncio era passar dias criando as mais óbvias intervenções. Se campanha para um seguro fúnebre, “os preços estão pela hora da morte”, “compre antes que seja tarde”, “quem vai se preocupar os pregos da chuteira”. Naquela ocasião, o trabalho que devia ir à TV era a venda de um plano de saúde para pequenas empresas, com no mínimo sete empregados. Depois do processo de criação, fizeram a Branca de Neve contratar o plano. Uma peça genial!
No jornalismo de televisão há muitas variáveis, como é comum em todos os empregos sujeitos a enormes pressões e instabilidades. Considero que um dos grandes desafios quanto à atração e retenção de talentos seja a habilidade de organização dos repórteres. O que consegue acordar diariamente às 4h, para uma hora depois começar a preparação de um jornal que vai ao ar às 6h, e repete essa atividade diariamente por meses ou anos, tem grande chance de ocupar o posto de âncora. Só por esse motivo já se teria encontrado um funcionário exemplar. Por outro lado, quando a variável ordem está dura demais, o trabalho criativo pode ficar minguado às vezes. “Jornalismo é metade negócios, metade show”, defendia o jornalista Gladimir Nascimento.
Sem penúria, sem narcisismo demasiado, sem jogos de poder ou psicológicos fora de controle, com humor para rir de si, o jornalismo de televisão pode ter sobrevida intelectual.
Você pode assistir à Philomena no site da BBC, e em uma série que acaba de estrear na Netflix. A hashtag #philomenacunk no Instagram tem trechos bons.
Leia insights sobre a interação de humanos com modelos de linguagem de IA, e sobre os ODS no Brasil. Lab Educação 2050 Ltda, que mantém este site, é signatária do Pacto Global das Nações Unidas.
Philomena Cunk inspira maior leveza e inovação em reportagens.
Rir de si mesmo fortalece vínculos e traz harmonia à prática jornalística.
Pesquisa da UFSC revela que experiência prolongada influencia gestores a optarem por medidas conservadoras.
Um estudo recente publicado na Revista Turismo, Visão e Ação (RTVA) revelou que gestores mais velhos e com maior tempo de serviço em restaurantes tendem a ser mais avessos ao risco em suas decisões corporativas. A pesquisa, conduzida por pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), analisou dados de mais de 2 mil restaurantes na Europa entre 2014 e 2016.
A pesquisa, intitulada "Influência das Características da Equipe de Gestão sobre a Tomada de Decisão de Risco: Evidências do Ramo de Restaurantes", utilizou a base de dados Amadeus e aplicou o método dos mínimos quadrados para analisar a relação entre as características dos gestores – idade, tempo de serviço, gênero e tamanho da equipe – e o nível de alavancagem financeira das empresas, usado como indicador de tomada de risco.
Os resultados mostraram uma correlação negativa significativa entre a idade e o tempo de serviço dos gestores e a propensão ao risco. Gestores mais velhos e aqueles que ocupavam o mesmo cargo há mais tempo demonstraram preferência por decisões mais conservadoras, optando por manter o status quo em vez de adotar estratégias inovadoras ou arriscadas.
Contrariando algumas expectativas, o estudo não encontrou relação significativa entre o tamanho da equipe de gestão ou a participação feminina e a tomada de risco. Embora pesquisas anteriores tenham sugerido uma possível influência desses fatores, os dados analisados não confirmaram essa hipótese no contexto específico da indústria de restaurantes.
Os autores sugerem que a aversão ao risco demonstrada por gestores mais experientes pode estar relacionada à priorização da estabilidade e da reputação construída ao longo da carreira. A familiaridade com o setor e a preocupação em preservar os ganhos obtidos podem levá-los a evitar decisões que representem potenciais ameaças ao negócio.
As descobertas do estudo têm implicações importantes para a gestão de restaurantes. A pesquisa sugere que a composição da equipe gestora pode influenciar diretamente a estratégia e o desempenho das empresas. Restaurantes com gestores mais jovens podem estar mais dispostos a inovar e assumir riscos, enquanto aqueles liderados por gestores mais experientes podem priorizar a estabilidade e a segurança financeira.
Os pesquisadores destacam a necessidade de estudos adicionais para aprofundar a compreensão da relação entre as características dos gestores e a tomada de decisão em restaurantes. A investigação de fatores psicológicos, como a tolerância ao risco individual, e a análise de dados de um período mais amplo poderiam enriquecer a discussão e fornecer insights mais precisos para o setor.
Ausência de atualizações e de contexto em notícias contínuas afeta credibilidade e confiança dos leitores.
Uma suíte jornalística é a continuidade de uma notícia em novas matérias que atualizam as anteriores. Algo como "Duas pessoas ficaram feridas em um acidente"; depois, "Homens que ficaram feridos em acidente fazem cirurgia"; ainda, "Homens que se feriram em acidente recebem alta"; e, ainda, "Empresa responsável por acidente com feridos é multada". Todas essas manchetes fantasiosas têm a ver com um mesmo fato originário.
Não é todo tipo de notícia que merece uma continuidade. Alguns acontecimentos e realizações têm fôlego para uma única aparição. Seja como for, para estar uma ou várias vezes no jornal, a "coisa" tem de ser verdadeiramente uma notícia, o que, basicamente, significa que não é publicidade ou propaganda – mas isso é assunto para outra oportunidade.
Em termos de formato, uma suíte não é nada diferente de uma notícia nova. Até porque só se tem uma continuação quando um novo fato é revelado. Mas é no estilo, pelo que notei, que a marmita das suítes azedou – no sentido de por que perderam o fôlego nos últimos anos.
Vamos tomar por exemplo uma investigação policial. O jornalismo de boa e de má qualidade têm interesse em pautas criminais. Porém, nos dois tipos de qualidade fica um sabor de vício, quem sabe originário do prazer de se "furar" (quando um jornalista é o primeiro em noticiar algo). É uma pressa que mais atrapalha que ajuda: não raro, são apresentadas versões que colaboram com uma história que se quer contar, que pode não ter nada a ver com o que aconteceu de verdade.
No caso de Homem armado ameaça jovem negro em SP, e policial se recusa a agir por estar 'de folga'; veja vídeo, por exemplo. É uma história que rapidamente conquistou a atenção dos jornalistas e do público, porque um vídeo comprova não somente a omissão de uma policial como também a agressão dela contra um jovem. Aqui, não está em discussão se a policial acertou ou errou. Ao mesmo tempo, faltou, pela ausência de suítes, a ampliação do contexto do vídeo de três minutos.
Uma história contada por sua característica intrigante pode render minutos de audiência, e um aumento de visitantes no site. Porém, sem continuidade, é um tiro no pé. Em 2023, o Digital News Report do Reuters Institute identificou que a confiança dos brasileiros no jornalismo é de 43%, uma diminuição de 19 pontos percentuais desde 2015. Estatisticamente, a tendência de queda pode marcar 41% em 2024. Nesse cenário, todos os recursos de inteligência e de integridade são bem-vindos para melhorar esses números.
As suítes são uma oportunidade para garantir ao público que as escolhas de pauta representam, ainda que contramajoritariamente, o compromisso do veículo com uma história contada do começo ao fim, com todas as nuances. Para isso, a linha editorial como um todo, e mais ainda os repórteres e editores, têm de encarar a atividade investigativa com o desprendimento de contar as coisas como elas são, e não como deveriam ser.